Consumo, logo existo. Ou não?

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Coliving, coworking, economia colaborativa, minimalismo. A cada dia surgem mais tendências que buscam uma vida que não seja tão regida pelo modus vivendi capitalista. Nosso sistema econômico é movido pela venda da nossa força de trabalho em troca de um salário que nos distancia do medo de morrer de fome.

Mas não é só isso.

Somos seres desejantes

Dessa forma, o dinheiro nos permite realizar nossas vontades. Seja o sonho da casa própria, um smartphone de último tipo ou uma roupa que está na moda. Um desejo que não se resume a conquistar o que se deseja, pois uma vez realizado, o objeto de desejo se torna outro e assim vamos, de desejo em desejo, sem que nunca haja um fim.

Nosso consumo também constitui nossa identidade, nos distinguimos pelas mercadorias que escolhemos, e isso também mostra a qual classe social pertencemos. Pelos produtos que consumimos, encontramos pares com os mesmos hábitos de consumo (e capazes financeiramente de ter os mesmos hábitos). Da mesma forma, o emprego. Nossa ocupação não apenas nos provém nossas necessidades básicas, mas nos dá uma posição na sociedade. Depois de nosso nome, nos apresentamos por nossa profissão. Somos aquilo que temos, obviamente.

A gente não quer só comida

Num cenário desolado pela guerra, o desenhista Joe Sacco mostra em sua HQ Notas sobre Gaza, a felicidade (e orgulho) de uma garota em  ganho botas novas e na moda em uma doação de parentes. Essa diferenciação, esse afeto de realização provinda pelo consumo, talvez isso explique a utopia comunista, que não se realiza. Uma das imagens que melhor demonstra isso é a inauguração do primeiro McDonald’s na Rússia em 1990. Multidão que se formou em busca de um Big Mac, símbolo máximo do capitalismo.

Não é só símbolo de status, muitas vezes temos uma relação afetiva com nossas conquistas materiais, com os produtos que consumimos. Quando se fala de uma marca de bolo, não se ouve o nome do produto, mas se sente aquele gosto de infância misturado ao sabor do doce. Não se escolhe apenas pela qualidade ou relação custo-benefício, mas pelos atributos que ganhamos com o uso. I’m a Mac, não quero ser um PC.

Colaborar, cocriar, coworking, coliving

Hoje vivemos uma tentativa de flexibilização das relações de trabalho com o home office, que contrasta com as longas jornadas de quem precisa manter seu emprego, em um País com uma taxa de desemprego cada vez maior. É a figura do empreendedor que troca o trabalho das 9h às 18h pelo horário flexível, com tempo para família, com tempo para mais bem-estar e qualidade de vida, com tempo.

Nessa realidade, o coworking tem também surgido como uma solução. O compartilhamento de espaços também incentiva a troca entre as pessoas, é uma saída para quem não consegue arcar com os altos custos de um escritório e para os home office, a oportunidade de sair de casa.

Um viés da economia colaborativa, do qual fazem o airbnb e o uber. Compartilhar, colaborar, conviver. “O futuro é co”, apregoa uma rede de coworking. Atualmente, a palavra da vez é o coliving, iniciativa que já acontece em países como a Suécia. Adultos dividem uma mesma casa, não como se fosse uma pensão, mas talvez nos moldes de uma república, só que com seus maridos e esposas, e filhos.

Todas iniciativas partem do mesmo pressuposto: viver mais com menos. Tentativa de deixar de viver nos moldes do sistema capitalista. O último deles, o minimalismo, que pressupõe que não precisamos de tantos produtos pra viver. E propõe uma vida mais austera e, portanto, que precise de menos dinheiro e menos trabalho para se manter.

No entanto, fica a pergunta: participar desse processo e ser um coworker, participar de um coliving e ser um adepto no minimalismo não seria apenas outro tipo de consumo? Querer ser identificado como alguém que não é ligado ao capitalismo, não é ainda pensar a vida, seus hábitos e costumes a partir do viés econômico?

Baseado no texto: LORDON, Fréderic. Por um estruturalismo das paixões. In: A Sociedade dos Afetos. Campinas: Papirus, 2015.

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