Houve consumo?

Hordas de pessoas em um outlet, numa BlackFriday, carregadas de sacolas de lojas de grife.
Imagine a situação e responda rápido:  Houve consumo?
Ok, vamos complicar?

  • Um amigo vai jantar na sua casa, compra um vinho e leva de presente. Houve consumo?
  • Um amigo vai jantar na sua casa e leva um vinho artesanal, fabricado pela família dele. Houve consumo?
  • Um amigo vai jantar na sua casa e vocês conversam longamente sobre vinhos, técnicas de produção e serviço, cepas, rótulos preferidos… Houve consumo?
  • Agora imagine que o orçamento ficou curto. Nada de jantares e vinhos. Economizar é a ordem do dia. Você fica em casa, assiste à TV aberta, lê o jornal gratuito do metrô, põe um tênis de corrida e e dá uma volta no bairro, lava o carro, toma um bom banho, troca mensagens pelo whatsapp e atualiza o seu perfil do Instagram. Houve consumo?

Se você respondeu sim a todas essas questões (ainda que alguns “sins’ tenham sido mais fáceis que outros), percebeu que, para discutirmos o consumo, é fundamental ultrapassarmos o estereótipo segundo o qual consumo é sempre sinônimo de consumismo.
Para Marx, o capitalismo divorciou as pessoas das coisas. Isso implicou em olhar para os objetos como uma abstração – ora uma coisa vívida, meio mágica, ora uma coisa sem vida. Descartes deu sua contribuição, posicionando a mente como uma entidade separada do mundo material. Kant completou a vitória da humanidade sobre a coisas. Por fim, a modernidade deu ao homem ocidental a ilusão de controlar a matéria. Nossa relação com as coisas foi ocultada.
Se coisas e pessoas não são nem continuidades, nem podem ser vistas em pé de igualdade sob hipótese, restaria saber se as coisas nos são superiores ou inferiores. Não surpreende, portanto, que haja um discurso classifica os objetos como subordinados e descartáveis, e outro que os vê como se fossem insubordinados e essenciais.
Precisamos fazer as pazes com o mundo das coisas. Por princípio, coisas não são nem perigosas, nem salvadoras. Não somos seus escravos, nem totalmente desprendidos delas. Essa fixação nos seres humanos como sujeitos independentes é uma das fontes da nossa bagunça, de uma confusão que embaralha críticas mais fundamentadas sobre consumo.
Temos problemas com as coisas que os homens das cavernas não tinham? Sim.
Mas, juntos, homens e coisas, vivemos uma aventura desde então.
Fizemos parte de uma História que levou à construção de uma complexa cultura, a cultura do consumo.
Se você gostou dessa reflexão, vale conferir o artigo Consumo: cidadania em perigo?, das doutoras Maria Aparecida Baccega e Gisela Granjeiro Castro, professoras do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Práticas de Consumo (PPGCOM) da ESPM. Nele, as autoras discutem a centralidade do consumo, os desafios nos estudos do tema e caminhos de abordagem para uma compreensão do consumo nem preconceituosa, nem ingênua, mas científica.
 
 

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