Música “alternativa” na Vila Madalena: práticas musicais juvenis na cidade
Por Simoni Luci Pereira
Introdução
A cidade e as culturas juvenis pensadas em articulação às culturas midiáticas colaboram para a compreensão das experiências urbanas em metrópoles como São Paulo. Nestas, os cenários e
os grupos urbanos, em particular os jovens, carregam, em suas práticas e imaginários, sentidos de socialidades/sociabilidades, visões e escutas do mundo, sensibilidades e afetos nos quais entretenimento, consumo, estética, práticas musicais não estão dissociadas, mas em complexa articulação (Rocha e Pereira, 2014).
A interpretação do trinômio cidade, juventude e mídias passa hoj, de alguma maneira, pela compreensão de que os territórios, fronteiras e áreas espaciais não podem ser encarados como estanques, fixos, bem como as lógicas culturais que os caracterizam. Não apenas os deslocamentos físicos e espaciais dos grupos pela cidade, como também um nomadismo simbólico articulado ao componente midiático da experiência urbana se impõem no que aqui se enfatiza.
A noção de “sociabilidades alargadas”, como proposto por Agier (2011), que se refere às interações entre a cultura local e situacional dos grupos urbanos e às macroestruturas sociais das cidades, ajuda a embasar uma discussão que focaliza o dinamismo e a complexidade dos grupos urbanos em seus deslocamentos, suas apropriações dos espaços concretos e simbólicos, suas formas de se agre- garem em torno de estilos, modas, circuitos (Herschmann, 2013) ou cenas ( Janotti Jr e Sá, 2013) musicais. Assim, o trabalho de etnografia e cartografia de metrópoles impõe uma atenção às especificidades do urbano e da vida nas cidades, salientando o papel preponderante dos nomadismos, deslocamentos reais e simbólicos presentes no dinamismo da vida urbana.
A interpretação de cenas ou circuitos culturais3 em meios urbanos revela forte ligação com práticas de etnografia das cidades. Pensar a cidade na conjugação de enfoques comunicacionais e culturais pode contribuir para uma compreensão mais profunda das relações entre culturas urbanas, cenas musicais, culturas midiáticas e do consumo, em que identidades, pertencimentos, afetos, socialidades, formas de autorrepresentação e visibilidade/audibilidade juvenis se articulam entre práticas e imaginários, em que a dimensão urbana e sua cultura são atravessadas por lógicas comunicacionais/midiáticas que se tornam constitutivas da vida nas cidades (Pereira 2014).
Atenta-se para uma concepção de juventude(s) no plural e de jovens ao mesmo tempo singulares (inclusão/ exclusão no contexto das desigualdades sociais; exposição à violência; particularidades de gênero, etnia, escolaridade, moradia, consumo) e universais (conflitos geracionais, linguagem, rebeldia, adesão ao movimento) (Borelli et al., 2009). Constata-se que o segmento juvenil se torna o mais atingido pelas rapidíssimas transformações no panorama das culturas contemporâneas, em especial aquelas relacio- nadas à vida cotidiana em grandes metrópoles (viver ‘na’ e viver ‘a’ cidade) e às culturas digitais (emergência de novos sensórios e ordens de sensibilidade). A vivência metropolitana é caracterizada por deslocamentos temporais em que se mesclam tempos de passagem, de alternâncias, de simultaneidades; é também constituída por fluxos e deslocamentos espaciais (tomar conta da cidade, em circulação transversal; explodir os limites da espacialidade oficial, por “des-centramentos e des-espacialização”(Martín-Barbero, 1997) e, ainda, configurada pelas formas de apropriação, consentida ou não, de espaços e lugares (Certeau, 1994).