Os Álbuns Fotojornalísticos Online e a Construção do Acontecimento: atribuições de sentido a partir da composição imagética dos protestos de junho

Por Eliza Bachega Casadei

“Se o direito à cidade é um grito, uma demanda, então é um grito que é ouvido e uma demanda que tem força apenas na medida em que existe um espaço a partir do qual e dentro do qual esse grito e essa demanda são visíveis” (MITCHELL apud HARVEY, 2013, p.40).

Foto por: Gianluca Ramalho
Foto por: Gianluca Ramalho

É nesse sentido que a prática política só pode ocorrer num exercício de visibilidade em que haja a efetiva inserção das demandas locais em contextos de esfera pública ampliados.

As manifestações populares de junho de 2013, pelo Brasil, foram amplamente noticiadas e encontraram um campo fértil de divulgação pública. O significado atribuído a esse acontecimento, contudo, esteve em um campo acirrado de disputas. Ao comentar os protestos, Slavoj Žižek aponta para o fato de que o sentido de uma determinada demanda social sempre se processa em um campo de constantes renegociações. “Aqui, novamente, o velho lema de Hegel de que ‘os segredos dos antigos eram segredos também para os próprios egípcios’ mantém-se plenamente: a luta pela interpretação dos protestos não é apenas ‘epistemológica’”. E isso porque “a luta dos jornalistas e teóricos sobre o verdadeiro teor dos protestos é também uma luta ‘ontológica’, que diz respeito à coisa em si, que ocorre no centro dos próprios protestos” (ŽIŽEK, 2013, p.48).

Dentre os vários meios de visibilidade conseguidos, os álbuns fotográficos online pertencentes a veículos da grande imprensa constituem espaços interessantes de disputa simbólica acerca do sentido dos protestos. No dia 18 de Junho de 2013, o site UOL publicou uma compilação fotográfica que prometia ao leitor: “Veja as principais imagens que resumem os protestos no país”, em uma matéria com trinta fotografias. No dia seguinte, o site da Veja disponibiliza uma galeria com 320 fotos dos protestos com a chamada “Acompanhe passo a passo os protestos pelo Brasil”2. No dia 21 de Junho, é a Folha de S. Paulo que publica, no Folha Online, uma seleção “das melhores imagens dos protestos no Brasil”, em um álbum virtual composto por vinte e três fotografias3.

Nesses espaços, estão articuladas tanto fotografias de profissionais da imprensa quanto de amadores que participavam dos protestos. Além disso, trata-se de ambientes interessantes na medida em que se propõem a elencar as fotos presumivelmente “mais importantes” ou “mais significativas” do evento em questão.

É possível entrever que as fotografias selecionadas continham alguns elementos composicionais em comum, pertencentes a um domínio simbólico bastante demarcado. Esses arranjos composicionais comuns, portanto, demarcam alguns dos sentidos e valores que foram dados aos protestos por esses veículos e a maneira como esse acontecimento foi interpretado a partir das imagens. O objetivo do presente artigo é, justamente, isolar esses elementos comuns e analisá-los sob a perspectiva dos efeitos de sentido que essas técnicas de composição engendram para que possamos demarcar quais foram as significações urdidas a esse acontecimento nesses espaços imagéticos.

Para Harvey (2013, p.24), há mesmo uma ligação fundamental entre a imaginação e o desejo: “o que separa o pior dos arquitetos das melhores abelhas é que o arquiteto erige uma estrutura na imaginação antes de materializá-la no solo”. As fotografias escolhidas pelos sites como “as mais relevantes” dos protestos são sintomas das interpretações comuns que foram urdidas acerca dos protestos bem como dos imaginários coletivos que foram mobilizados em suas construções imagéticas.

 


 
Este artigo foi publicado originalmente na Liinc em revista, v.10, n.1 (2014) do do Laboratório Interdisciplinar em Informação e Conhecimento da UFRJ.
O artigo completo pode ser encontrado em pdf, aqui: PDF.

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