Precisamos falar sobre o suicídio, uma pesquisa acadêmica mais do que necessária

Tirar a própria vida é um tema tabu. No meio jornalístico se prega não noticiar a prática, pois se entende que sua divulgação poderia incentivar outras pessoas a tomar tal atitude. Essa relação é confirmada por estudo dos EUA, que afirma que no período de veiculação da série “13 Reasons Why” (13 Razões Para, em português) do serviço de streaming Netflix, o volume de buscas por termos ligados ao suicídio (retratado no programa) aumentou, segundo reportagem da Revista Época.

Talles Rangel ECA-USP
Talles Rangel, doutorando da ECA-USP

Condenado no âmbito moral e religioso, tentar suicidar-se não é crime. É este o tema escolhido por Talles Rangel, jornalista do Grupo Bandeirantes, para estudar no seu Doutorado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo – USP, onde também fez seu Mestrado.

“Uma das questões que eu me perguntava: o que acontece com esse indivíduo que teoricamente entra bem e vai se obliterando no transcorrer da jornada acadêmica e em alguns casos chega a tirar a vida. O que acontece nessa organização?”, questiona. Seu objeto de estudo não está completamente delineado, mas Rangel pensa que ao tratar de “organizações”, não deve se limitar tão somente às empresas e abarcar também o ambiente universitário.

Adoecimento do ambiente profissional e acadêmico

Sua pesquisa foca no processo comunicacional de adoecimento no ambiente organizacional, que pode levar em seu extremo ao indivíduo tirar sua própria vida. São três os eixos epistemológicos compreendidos em sua tese: comunicação, silenciamento da organização e silenciamento do próprio indivíduo.

“Outra interface que me ajuda a compreender esses fenômenos é o da saúde coletiva. Para eu entender melhor o processo de saúde, adoecimento e também o suicídio. E também como isso está relacionado ao ambiente do trabalho”, complementa o pesquisador. Em 2018, o renomado chef e apresentador de TV Anthony Bourdain se matou aos 61 anos, apenas três dias após a estilista norte-americana Kate Spade. Ambos profissionais de sucesso.

No Brasil e no mundo

De acordo com matéria do Jornal Nexo publicado no início deste ano, estudo da revista Nature realizado em diversos países com estudantes de diversos cursos, aponta que alunos de pós-graduação têm seis vezes mais chances de enfrentar depressão e ansiedade, sendo 56% da área de humanas. Entre os motivos apresentados estão a pouca atenção ou a falta de uma tutela adequada por parte dos orientadores desses alunos, o baixo valor das bolsas para doutoramento e a falta de perspectiva de emprego dentro ou fora da academia, concluída a titulação de mestre ou doutor.

No Brasil, as taxas de suicídio têm crescido entre crianças e adolescentes. Entre 2000 e 2015, aumentaram 65% entre pessoas com idade entre 10 a 14 anos e 45% de 15 a 19 anos, mostra o jornal Folha de S.Paulo em análise de 2018. A matéria aborda ainda o fato de que em um período de apenas duas semanas, três estudantes de colégios privados da elite da capital de São Paulo se suicidaram.

Objeto de pesquisa

O foco do estudo ainda não está fechado também, pois seu medo é de não encontrar participantes para sua pesquisa, uma vez que falar sobre uma tentativa de suicídio por quem a cometeu não deve ser tarefa das mais fáceis e o mesmo acontece com adoecimento e depressão no ambiente de trabalho.

Ainda finalizando o primeiro ano de seus quatro de doutoramento, Talles Rangel vem cursando disciplinas no Departamento de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo – USP, o que lhe permite perceber a interface entre saúde e ciências sociais, em sua opinião. A experiência também lhe permitiu expandir o olhar sobre o que é saúde e adoecimento, o que é normal e patológico, e como se trabalha a questão da saúde coletiva no ambiente social, com suas devidas dimensões políticas, econômicas e culturais.

“O que me motivou a escolher este objeto foi a relevância do tema. Penso que tinha que ser algo voltado à sociedade, pois nós recebemos fomento dos governos, que provém dos impostos, então temos que voltar o conhecimento para a sociedade”, explica o doutorando. Relevância de pesquisa que é questão de vida ou morte.

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