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Os mais novos podem achar estranha essa informação, mas houve um tempo em que música não circulava pela internet. Não havia YouTube, Spotify, Apple Music ou Google Play. MP3 era uma sigla desconhecida. Para consumir música, assistia-se à extinta MTV Brasil ou compravam-se CDs (quase sempre a preços nada amigáveis). Até a pirataria era pouco acessível nessa época, porque a maioria dos computadores caseiros ainda não tinha gravadores de CD. Foi nesse período jurássico, do final do século passado, que surgiu o Napster, a primeira plataforma digital para download (gratuito!) de músicas.
Tal qual o pequeno mas astuto David ao derrotar o gigante Golias, o jovem estadunidense Shawn Fanning, criador do Naspter, acabou por abalar uma supremacia de décadas do cartel da indústria fonográfica.

Aos dezoito anos, Fanning decidiu abandonar seu primeiro ano na Northeastern University e trabalhar full time em uma idéia que não lhe saía da cabeça: viabilizar um sistema que expandisse a oferta de música na internet. Convencido de que outros estariam trabalhando em idéia semelhante e de que precisaria ser rápido para não perder a corrida, trabalhou por meses sem cessar até lançar seu aplicativo, em 1999. Durante este período, lutou sozinho contra a corrente, já que não pode contar com apoio de seus companheiros de chat-rooms sobre programação, que consideravam sua idéia equivocada por princípio: “Este é um mundo de individualistas e ninguém vai querer compartilhar nada.”, argumentavam.

Mas Fanning tinha a convicção de que compartilhar seria a chave para resolver problemas de escassez. Apesar do ceticismo à volta, compreendia que isto estaria em perfeita sintonia com os princípios fundamentais que norteiam a existência da Internet.
Os fatos que se seguiram provaram que estava certo. Em tempo recorde, o Napster tornou-se tremendamente popular, especialmente dentre jovens universitários americanos, além de uma multidão de outros pelo mundo afora. Em termos de número de usuários, este foi o site de crescimento mais rápido em toda a história da rede, fazendo do Napster um dos fenômenos mais espetaculares do ano 2000, figurando com destaque nas retrospectivas do século nos principais periódicos pelo mundo afora, apontado como percursor das mudanças que o novo milênio traria.
Devido à sua gratuidade e à inovadora simplicidade operacional, em muito pouco tempo, quase todas as músicas mais populares dos últimos quarenta anos estavam virtualmente disponíveis em seu banco de dados. Muito menos simples, porém, foi o enfrentamento dos embates que puseram poderosas instituições e legiões artistas consagrados que consideram o Napster um afrontoso caso de pirataria e desrespeito aos direitos autorais contra uma parcela significativa de consumidores de música, defensores da internet livre e alguns artistas dissidentes.
Além do interesse – talvez demagógico – de compor uma imagem simpática de ‘artistas preocupados com o público’, o que parecia motivar a atitude desse grupo de artistas pró-Napster era que sua maior fonte de renda provinha da venda de ingressos para shows e de ações de merchandising, não da venda de discos. Alegava-se que apenas músicos cuja vendagem de CDs fosse altíssima chegavam a lucrar com isto. A parte do leão ficava com as gravadoras. Por esta razão, músicos como o lendário Jerry Garcia, falecido em 1995, encorajam o público a fazer e distribuir gravações piratas de seus shows, mesmo antes do mundo conhecer o Napster. No Brasil, o cantor Lobão pedia aos fãs: “me pirateiem, por favor!”.
Mas as grandes gravadoras custaram a perceber o enorme potencial do mercado on-line. Só depois de anos de custosos processos judiciais, campanhas, repressões e boicotes, finalmente passaram a oferecer sistemas de distribuição com base em assinaturas de baixo custo, o que garantiria o pagamento dos royalties, ao mesmo tempo arrebanharia a crescente demanda por música on-line. Desta forma, o mercado de divulgação e distribuição de música digital na rede passaria a ser devidamente regulamentado e os direitos autorais salvaguardados. Nascia um todo um mercado do compartilhamento.

Para Clay Shirky – um dos editores da revista digital feed e professor de Media Studies no Hunter College – a indústria fonográfica insistia em alardear a possibilidade de prejuízos monumentais caso o compartilhamento de músicas viesse a ser feito em larga escala.  Mas a implosão do mercado de música seria era apenas a ponta de um iceberg: dada a acelerada desmaterialização das mercadorias, temiam que a “onda” do compartilhamento acabasse por se esgueirar sem limites para o mercado filmes, livros, jogos eletrônicos etc.

Em 2010, em meio a protestos de membros da classe artística e da mobilização de ciberativistas, os direitos de marca do Napster acabaram vendidos e a plataforma foi transformada em um aplicativo pago de streaming. O gato de headphones que arranhou a indústria nunca mais gozou – nem de perto – da mesma popularidade. De fato, há muito quem fique surpreso ao saber que a marca ainda exista.  Da época em que o Napster reinventou a web, ficou a logomarca e o legado de ter contribuído para trazer a indústria fonográfica para a era da internet.
Gostou? Então acesse o artigo entitulado O Caso Napster, da autoria da docente do PPGCOM da ESPM -SP,  Gisela Castro, que  inspirou esse post e é parte do livro Música Serve para Pensar.
 

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