Campanha Casas José Araújo

Nas décadas de 1970 a 1990 veiculava na TV pernambucana comerciais das Casas José Araújo, loja de varejo de tecidos bastante conhecida e com preços acessíveis, cujo slogan dizia “onde quem manda é o freguês”. Eu estava chegando para estudar em Recife, no ano de 1979, e fiquei encantada com esses comerciais que retratavam cenas da cultura local com as quais eu me identificava. É importante, na publicidade, a identificação do público com a sua memória, sua história, seu cotidiano. Essas campanhas são lembradas até hoje, seus jingles – alguns cantados por Luiz Gonzaga – continuam sendo cantarolados por quem os conheceu e, dessa forma, a cultura regional estava sendo preservada de uma forma positiva.

As Casas Zé Araújo, mostram pro povo agora, belezas da nossa gente, retratos da nossa história!” 

Assim iniciavam alguns dos comerciais. O primeiro deles foi criado em 1975 pelo publicitário Carol Fernandes (falecido no ano de 2016), na agência Itaity Publicidade. No lançamento da primeira campanha, Carol foi criticado pelos publicitários e jornalistas locais por retratar um “folclore chapliniano” (fazendo menção às cenas cômicas dos filmes de Charles Chaplin). Entretanto, o povo gostou porque viu sua cultura representada nas campanhas, tanto que, em seguida, foi adicionado o bordão “e o povão gostando”. As campanhas retratavam a ciranda na praia, o arraial junino, a procissão de fé, o bloco de carnaval, o frevo, o dia-a-dia do povo, dentre tantas outras cenas da cultura local e com as quais os consumidores se identificavam e que ficaram na sua memória afetiva.

Cena de um dos comerciais

Ainda hoje as campanhas são lembradas, pois além da identificação por parte do povo, foram amplamente divulgadas e premiadas em diversos festivais.

Em 1979, Carol Fernandes foi considerado o publicitário do ano, em prêmio da revista Propaganda e do jornal Diario de Pernambuco e, no discurso proferido na ocasião, na Assembleia Legislativa, afirmou que “É melhor fazer uma linguagem regional, de primeira qualidade, do que tentar fazer uma pretensa comunicação universal, de terceira ou quarta qualidade. Nossos clientes estão na terra e seus consumidores também”.

A empresa Casas José Araújo surgiu na cidade de Pesqueira, interior de Pernambuco, no ano de 1890, expandindo-se para as principais cidades de Pernambuco e do Nordeste, chegando a ter filiais também em Brasília e São Paulo. Atualmente, há apenas uma loja no bairro da Tamarineira em Recife, mas continua como sinônimo de variedade e bom preço. Nos autofalantes da loja, são transmitidos todos os jingles das campanhas. É um revival emotivo para os clientes que a visitam.

De todas as campanhas realizadas, algumas tiveram mais destaque, tendo um jingle cantado por Luiz Gonzaga (https://www.youtube.com/watch?v=d6z9nYfqDRo), que também participou de outras trilhas ao longo desse período.

Campanha Boneca de Pano

As bonecas de pano eram os brinquedos preferidos das crianças, tive várias delas. Na campanha, as bonecas davam vida às cenas cotidianas.

“As coisas do meu Nordeste são bonitas de lascar/ Uma boneca de feira de pano toda enfeitada /Coisas de gente bem simples que não é sofisticada/ No precinho José Araújo todas compram sem chorar/ Costurando sua roupa, roupa nova vai usar/ Um vestido por semana e a vizinha vai pensar: Rica é aquela mulher que sabe economizar”. 

Campanha Tem feira nas Casas José Araújo

As feiras nas ruas ainda hoje acontecem principalmente nas cidades do interior. Nelas, compra-se de tudo e com preços acessíveis. As Casas José Araújo dispunham diariamente de tabuleiros com tecidos em promoção, uma referência às feiras.

“Tem feira nas Casas Zé Araújo/ Oxente, vamos lá comprar/ Tem pano, retalho à beça, resto de peça, pra se comprar/ Tem saldo no tabuleiro/ Com pouco dinheiro você vai levar/ Tem feira nas Casas Zé Araújo/ Oxente, vamos lá comprar/Oxente, vamos lá comprar/Tem feira nas Casas Zé Araújo/Oxente, vamos lá comprar”

Campanha Ciranda (propaganda premiada)

A ciranda é um ritmo presente nas praias, dançadas em grande roda ao som de uma batida lenta e repetida, onde são aceitas todas as pessoas independentes de credo, cor ou raça.

“Vivemos nesta terra forte/ neste sol do norte, de luz, de amor/ Sorrindo vamos para a praia de maiô de saia, o verão chegou/ Em Zé Araújo você tem vez, compre no precinho que ele é do freguês.”

Campanha Davanira 

Essa campanha veiculou no período do carnaval de 1992. Foi ambientada na cidade de Olinda, com a participação de componentes do bloco carnavalesco “As Virgens de Olinda”, bloco irreverente com mais de 600 desfilantes vestidos de mulher.  Eu passei o carnaval em Olinda este ano e presenciei, muitas vezes, a aglomeração de um grupo de pessoas cantando o jingle em todas as ocasiões que aparecia alguma garota em uma janela. 

“Davanira é ela/ Tire sua roupa da janela/ Toda vez que vejo ela sem você/ Só me alembro de você sem ela.”

Essas campanhas nunca saíram da memória do povo pernambucano e suas estratégias criativas são estudadas nas escolas de Publicidade e Propaganda, como um exemplo de sucesso, pois a identidade de um povo é marca forte na lembrança.


Referências:

http://www.nasentrelinhas.com.br/noticias/costurando-ideias/490/memorias-da-casa-onde-quem-manda-e-o-fregues/


GISELDA VILAÇA – é designer, publicitária, mestre em Linguística e pós-graduada em Gastronomia. Leciona nos cursos de Publicidade e Propaganda, Jornalismo e Design, no Centro Universitário UniFBV em Recife. É pesquisadora do GP-CNPq Comunicação, Consumo e Identidades Socioculturais (CICO), PPGCom-ESPM. Email: [email protected].

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