O poder da palavra

Em meus estudos acadêmicos, li um texto sobre a palavra bem-dita, a mal-dita e aquela que não é dita (a dita-cuja?). Eu, pelo menos, acabo não crendo muito na força do verbo, apesar de gostar de me apresentar como “uma mulher de palavra”.

Mas eis que nesta semana, me aconteceu um fiat lux na forma de epifania.

Conhecimento é poder Foto: Fred Kearney
Conhecimento é poder
Foto: Fred Kearney

It’s the end of the world

Desde a gravidez do meu filho eu tenho fobia de lugares fechados. Toda vez que entro no metrô lá vem aquela angústia que eu conheço tão bem. Falta de ar e o medo de me sentir presa. Não é só isso.

O pior é o medo de ter medo. Só de imaginar a possibilidade do trem parar e eu não conseguir controlar meu pavor. Talvez ele nem pare e a viagem transcorra sossegada, mas eu mesmo assim viajo apreensiva.

Hoje meu filho tem 20 anos e durante todo esse tempo eu venho convivendo com a questão. Até que tive um outro quiproquó a ser tratado na terapia e o tratamento indicado foi enfrentar a dificuldade; não fugir dela.

Daí me veio:
– Mas se basta encarar pra conseguir superar, por que até hoje eu não perdi a claustrofobia? Eu pego metrô todos os dias!, eu disse.
– Eliana, quem tem fobia não pega o metrô. Dá outro jeito, o terapeuta me respondeu.
Fiquei um tempo deglutindo a verdade. Eu tirei carteira de motorista há três anos, mas nunca, nunquinha, fui atrás de comprar um carro.

As we know it

O mais doido veio depois. Agora eu não apenas ando de metrô, mas consigo ler no celular e observar as pessoas no vagão. Às vezes, nem percebo que já saiu ou chegou a uma nova estação.

Percebi que eu poderia sentir um incômodo dentro do metrô, mas isso não era FOBIA. E só por saber que não tinha esse nome, o peso que o termo carrega se foi e todo o mal-estar junto. Vai entender o nosso cérebro?

I feel fine

A partir dessa experiência, podemos fazer algumas correlações. Por exemplo, será que existia a TPM feminina antes do termo ser criado? Talvez existisse, mas será que acontecia com a frequência que ocorre hoje?

Em um caso contrário, há dois anos um dos meus entrevistados para uma reportagem, queixou-se da necessidade se utilizar a palavra correta. Segundo ele, os alunos chamavam de bullying o que na verdade era um caso de racismo na escola. Só com a designação certa seria possível se tomar as medidas para a solução. Quando se fala de colégios, hoje quase tudo é classificado como bullying, disse-me.

Consumo

Interessante pensar o poder de uma palavra a partir do momento que ela nasce, que ganha um nome. Será que antes o que ela designava não existia? Ou sua criação aumenta a frequência do surgimento daquilo a que ela se refere?

Nesse contexto, penso nos termos da moda como “ecossistema de inovação”, “empoderamento” e “propósito”, por exemplo. Talvez com sua repetição também percam muito de sua força e sejam apenas um eco daquele primeiro texto que as alçou ao estrelato.

Nessa linha vai um pesquisa feita pela professora do PPGCOM da ESPM, Eliza Bachega Casadei, que estudo o uso do termo “consumismo”.

A primeira aparição do termo surgiu em 1955 num jornal brasileiro e só voltou em 1963, quando “passa a figurar como um tema importante nas discussões públicas dos anos 70”, segundo a pequisadora. Em 1970 era usado como um termo técnico, usado no caderno de economia , usado para se referir aos ajustes necessários entre a oferta e a demanda de produtos.

Só em 1980 que “consumismo” ganha o significado atual, de desvio de comportamento.

Logo se vê que não é à toa que dar a alguém a sua palavra valha tanto. E tenho dito.

 

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